Dias atrás a televisão mostrou um trecho do interrogatório judicial de Marcola, acusado de ser líder do PCC. Conforme determina a lei, depois que o juiz faz ao acusado todas as perguntas que entender necessárias, deve indagá-lo se tem algo mais a acrescentar em sua defesa. Foi, então, que Marcola afirmou serem injustas as acusações que lhe vinham sendo feitas ultimamente; que ele nada tinha a ver com os ataques do PCC e que essas imputações estavam dificultando muito sua situação, impossibilitando sua defesa. Será que ele mentiu?
Hipótese 1: Sim. Nos últimos tempos a imprensa geral tem noticiado diariamente a ocorrência de ataques terroristas, crimes que não demonstram nenhuma vantagem aparente, a não ser a de causar pânico, intimidação, retaliação. A intenção parece ser a de desafiar o Estado, exclusivamente. Em alguns deles, seus autores deixam mensagens tipo “Pelo fim da opressão nos presídios” e coisas outras que indicam ligação dos atos a ações do PCC. Nesse caso, há motivos para se acreditar que os ataques são obra do PCC e, sendo Marcola seu líder, haveria de ser tido como autor de cada um deles.
Hipótese 2: Marcola falou a verdade. O grande grau de coordenação nos ataques (ações feitas ao mesmo tempo, com idênticas características, contra alvos semelhantes, etc) está entre os maiores indícios de que os envolvidos recebem instruções de um núcleo centralizado de comando e o PCC é sempre apontado como tal. Entretanto, essa onda de ataques gera um ambiente muito favorável a pessoas e grupos agirem “de carona” com base em motivos diversos. Por exemplo, algumas Prefeituras de São Paulo foram objeto de atentados (Miguelópolis entre elas). Ora, são órgãos do Governo Estadual os verdadeiros alvos estratégicos, principalmente os ligados à Segurança Pública (Penitenciárias, Fóruns, Ministério Público, etc). Ataques ao Governo Municipal são totalmente atípicos, sinal de estarem desvinculados ao PCC.
Por outro lado, o último Governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, é candidato à Presidência da República; logo, se os atentados desmoralizam São Paulo, desmoralizam que o comandou nos últimos anos. Isso é conveniente para os demais candidatos. Aqui estão, então, bons motivos para se acreditar que Marcola não é o mentor de todos os ataques.
O líder de uma grande instituição, seja ela uma empresa ou uma quadrilha, não pode ser pessoa tola ou ingênua. Diante de tudo o que nos é informado, Marcola sabe o quanto é difícil acreditar nessa sua tal inocência. Ainda assim, ele alegou, talvez animado por motivos que escapem às inteligências comuns dos mortais; talvez, pela mais surpreendente crença na imparcialidade, boa-fé, ou seja lá o que passe no espírito da população. Talvez, enfim, seja só uma questão processual. A verdade é um mistério.
Porém, o grande mistério parece estar na mente de Geraldo Alckmin. É simplesmente incrível o modo como ele se faz alheio a toda essa questão, dando declarações de como São Paulo vem agindo e reagindo com relação ao episódio; é como se ele nunca tivesse participado do Governo do Estado (São Paulo errou aqui, São Paulo acertou ali, se fosse eu...). Entretanto, a Segurança Pública também falhou e foi uma falha grave. Basta ver que o crime está sendo comandado de dentro dos presídios. Ora, Segurança Pública, pelas regras da Constituição Federal, é competência do Estado; a União e os Municípios podem oferecer ajuda, mas a decisão é do Estado e quem foi governador nos últimos períodos foi Alckmin. É de um extremo cinismo ele agora vir com essa de “não tenho nem nunca tive nada a ver com isso”. A grande pérola ele soltou dias atrás ao dizer “se eu for eleito Presidente não vai ter essa moleza não”. Mente duas vezes: primeira, porque, como já dito, o Governo Federal não pode cuidar da Segurança Pública, que é atribuição do Estado. Segunda, por que ao tempo em que foi governador e teve oportunidade de cuidar do problema a coisa chegou a uma situação que agora ele mesmo critica.
O político tem um compromisso com toda a população; o bandido, com ninguém. Logo, a mentira de Alckmin é pior, pois importa uma traição, enquanto a de Marcola decorre da própria natureza das coisas.