ele
concorda que impactar já na primeira frase é ótima estratégia.
Porém, se convenceu de que existem outras igualmente válidas e que
o encanto está não só no que é dito, mas também em como é dito.
Assim, como em tantos outros casos, com a maior segurança do mundo
ele aborda uma moça que provavelmente nem havia percebido que ele
estava lá.
- oi.
- oi.
- qual
teu nome?
-
viviane.
- o meu é
maurício.
- você
mora nesta cidade?
- moro.
- e faz o
quê?
Sim, o
papo estava bem fraco. Mas ele não se preocupava. O plano era deixar
rolar e lançar carta alta assim que o próprio jogo apresentasse a
oportunidade, por si só. Tipo, fazer comentário interessante sobre
a cidade ou a profissão dela. Mas a moça só despejava cartas
difíceis e quando, com cara de tédio, respondeu 'só trabalho', sem
nem dizer sua atividade, ele sentiu que poderia morrer com o zap na
mão. Para evitar a tragédia, armou-se de toda sua sinceridade e
disse:
- olha,
eu sei que estou falando coisas muito óbvias, mas é só pra quebrar
o gelo. Se você preferir podemos partir agora mesmo para uma
conversa de profundidade.
E com um
meio sorriso cínico emendou: eu sei um pouquinho de quase tudo o que
existe.
- Sério?
- ela perguntou com cara de surpresa e voz de deboche.
- Vou
dizer o que eu quero com você e para isso usarei termos da física
quântica.
Ela
respondeu com a sobrancelha.
- Bom,
todo mundo sabe que dois corpos não ocupam simultaneamente um mesmo lugar no espaço. Mas, segundo a física quântica, um mesmo
corpo pode ocupar ao mesmo tempo dois lugares no espaço.
Agora ela
respondeu com um movimento de cabeça e com olhos piscando, como quem
diz 'me convença' ou, talvez, 'acabe logo com essa chatice'.
- o fato
é que, seu eu pudesse escolher dois lugares para estar agora, eu
queria estar dentro e fora de você!
Como
sabia do risco de deixá-la tirar suas próprias conclusões sobre
essa cartada, ele acrescentou:
- uma
parte minha aqui, olhando pros teus olhos, e a outra aí dentro,
invadindo teu coração.
A frase
fez a tensão na testa dela desaparecer, criando um contraste tal que
ele sentiu que provavelmente acabara de se livrar de uma bofetada.
Mesmo assim, ela passou a mão na bolsa e disse:
- preciso
ir ao banheiro. Prazer em conhecê-lo, Maurício. Tchau.
Ele
pensou em usar física quântica mais uma vez, dizendo 'talvez eu esteja lá agora mesmo', mas ponderou:
física quântica não é para este público. E encerrou seu show, já
de olho na morena que bebia sozinha no balcão.