segunda-feira, março 12, 2007

A MÁGICA DA LEI

Nos últimos dias, causaram polêmica os valores gastos para Fernandinho Beira-Mar poder prestar depoimento nos processos em que é réu. Os noticiários divulgaram cifras astronômicas, incitaram a indignação do povo, entrevistaram “especialistas”, etc. Nossos parlamentares, sempre muito oportunistas, iniciaram o debate de leis para mudar a situação. Defendem que os depoimentos sejam feitos por vídeo-conferência; réu na cadeia, juiz no fórum.

Em primeiro lugar, é de se lembrar que para realizar a vídeo-conferência o presídio necessitaria de uma sala para os equipamentos, mas hoje, não há lugar nem para colocar presos. Obviamente, essa lei nasceria sem possibilidade de ser aplicada. “Não há dinheiro” para isso.

Por outro lado, o art. 185 do Código de Processo Penal Brasileiro – CPP - diz que “o interrogatório do acusado preso será feito no estabelecimento em que se encontrar, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato.

Como visto, se a preocupação é cortar gastos, não há necessidade de lei nova; basta cumprir as existentes. O CPP manda os juízes irem ao presídio e o valor gasto nessa operação, por não demandar forte esquema de segurança, é bastante módico. Ocorre que não há juiz disposto a abandonar o conforto do ar-condicionado de seu gabinete para entrar num presídio. Juiz também não cumpre lei!

A última parte do artigo 185 do CPP faz uma exceção: “Inexistindo segurança, o interrogatório será feito nos termos do Código de Processo Penal.” Talvez seja a falta de segurança a justificativa dos nossos magistrados. Por que, então, ao invés de mudar as regras do processo, não se mudam as condições de segurança dos presídios?

É que criar leis é mais fácil. Sobretudo, porque nem é preciso cumpri-las, como este exemplo demonstra. Esta é a verdadeira mágica da lei: dá resposta sem dar solução.

Mais que outra lei falaciosa, a mudança proposta oferece risco ao sistema processual. Cada pessoa julga de acordo com aquilo que conhece e o juiz não foge dessa regra. Se pretende oferecer soluções adequadas à sociedade é preciso conhecer sua realidade. Somente o contato com seus jurisdicionados e com o cotidiano destes, por mais duro e desagradável que seja, oferece ao juiz a oportunidade de ver que o mundo real é bem diferente do “mundo maravilhoso” de seu gabinete, de seu condomínio fechado, de seu clube. Do contrário, cada um de nós está sujeito a ser julgado, não pelo que é, mas pelo que o juiz imagina que seja.

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